No natal do ano passado foi dado como presente através do serviço de streaming Netflix a adaptação em forma de série da saga “Bridgerton”, essa é a primeira produção da Shonda Rhimes dentro da plataforma e já começou quebrando as portas. A série se passa em torno de 1813 e conta a história dos irmãos Bridgerton durante a temporada de casamentos em qual as debutantes tem como missão encontrar um marido e tudo é noticiado pela coluna de um jornal da Lady Wistledown, uma escritora anônima que revela todos os segredos dos cidadãos daquela cidade.
No total são nove livros e cada irmão da família tem o foco em um deles, os Bridgerton são uma família poderosa que perdeu o patriarca recentemente, algo que só passa ter mais foco quando a história passa a ser contada pela perspectiva do Anthony. Uma característica bem legal da família é que cada um dos filhos possuem como primeira letra do nome por ordem alfabetica, indo do a ao h e apesar de haver uma protagonista de fato, a série já se distancia dos livros ao dar um pequeno foco aos outros irmãos mais velhos já nesse primeiro ano.
Assim como no primeiro livro, a primeira temporada tem como protagonista a irmã mais velha, a Daphne, a personagem é a que mais aceita o seu lugar no mundo e por isso pode parecer um pouco chata inicialmente, mas com o decorrer da série vemos a personagem amadurecer e se empoderar. Apesar de já ter lido os livros, eu não sabia qual seria a narrativa da série e fiquei muito feliz em ver que o caminho seguido foi similar, o grande foco dessa primeira temporada foi o casal Daphne e Simon, mas foi tão dinâmico todo o processo que me fez sentir que assisti cinco temporadas dentro de uma só. Se uma pessoa vai assistir a série sem ter visto nada, a cada episódio ela pode se encontrar em uma nova série, inicialmente temos a Daphne tentando arranjar um marido e sendo impedida pelo seu irmão, para depois se envolver em uma história clichê com o Simon, depois um triângulo amoroso com o príncipe e depois se casando com o Simon, tudo isso em apenas 5 episódios. Fazer algo com tantos acontecimentos e posteriormente claramente dividindo a série em duas partes arriscado, mas um grande acerto, em uma temporada pudemos ver todo amor do casal principal crescer de maneira muito convincente e a química entre os dois atores foi tão grande que eu fui até pesquisar se eles estavam juntos na vida real.
O livro é inteiramente focado no casal principal, mal abrindo espaços para outros personagens, mas mesmo assim eu achei que a série conseguiu trabalhar ainda melhor a dinâmica do casal. Episódio pós episódio fomos vendo os dois se apaixonando, todas as cenas entre os dois eram muito bem escritas, em especial a cena do quadro onde a Daphne ajuda o Simon a entender o porquê de sua mãe amar aquele quadro em específico, para depois ver a mão dos dois tentando se encontrar e finalmente eles aceitando que se gostavam. Vivendo a vida de casados, a dinâmica entre os dois só melhora, é completamente normal você não querer filhos, mas no caso do duque era muito mais por uma questão de vingança e não desejo próprio, então no final Daphne finalmente entendeu seu marido e ele desistir dessa vingança em prol do amor dos dois.
Uma série com apenas 8 episódios conseguir dividir a temporada em duas partes de modo coeso e satisfatório é algo surpreendente, mas o time de roteiristas conseguiram, acompanhando a história pós casamento é perceptível o amadurecimento da série junto com sua protagonista, já que toda a vibe de série teen vai embora para dar espaço há um crescimento da Daphne e suas descobertas de uma mulher casada e espaço para outros personagens terem sua história contada. Parecia de fato que eu já estava acompanhando a segunda temporada, pois os problemas era bem mais complexos e desenvolvidos, a própria protagonista parecia outra mulher, o modo como ela se mantinha presente em seus deveres como duquesa, ir socorrer a família quando necessário e batia de frente com seu marido deu uma força a personagem que ainda não havia sido apresentada, a postura dela nos três últimos episódios deram um novo gás a série e fizeram ela fechar seu arco de protagonista com um saldo positivo.
Por se passar em uma época tão antiga seria impossível não se ter um contexto extremamente patriarcal, o objetivo de vida era se casar e nem podiam escolher quem seria o seu marido ou não, mas eu gostei que a série conseguiu mesmo através dessa realidade colocar mulheres empoderadas. Elas não saiam por ai reivindicando seus direitos, mas tinham plena consciência da desigualdade vivida e rebatiam isso de uma maneira mais sutil, como naquela sequência de cenas onde elas espalhavam a fofoca sobre o Nigel ou quando mostra a reunião da mulheres bebendo e jogando. A Eloise era o telespectador introduzido dentro da série e o tempo todo escrachava o quão hipócrita são o ideias da sociedade que vivemos até hoje, fiquei com bastante receio de transformarem a personagem em uma militante (o que seria extremamente irreal se tratando da época em que se passa), mas eles conseguiram dosar bem as falas da personagem, ela é mais utilizada como uma pessoa sensata que não aceita o que é imposto a ela.
Há diversos personagens masculinos na série, mas todo o foco estão nas mulheres, todas são bem diferentes uma das outras e trazem um olhar diferente de qual é o papel da mulher na sociedade. Vemos mulheres mais liberais e outras olhares mais conservadores, a nossa própria protagonista tem como maior sonho se casar e ter filhos e justamente por ter metas um pouco antiquadas para o contexto atual torna os seus momentos de ascensão tão fortes. Dentro do contexto da vida escolhido, Daphne consegue mostrar força ao confrontar a realidade com as quais não concorda e amadurece, apresentando sororidade com uma personagem que está sofrendo sozinha a principal represália que uma mulher sofre até hoje.
A Marina Thompson é outra em que a história vive em constate mudanças, ela chega sendo a possível candidata que roubaria o holofote da Daphne para si, mas posteriormente é revelado que ela está grávida e essa é a pior coisa que poderia acontecer para uma mulher solteira naquela época. A personagem sofre do inicio ao fim e vemos episódio após episódio a angustia daquela mulher que se vê tendo que buscar um casamento o mais rápido possível para que seu destino ainda não fosse pior, a decisão de por o Colin como uma de suas vítimas foi um acerto, pois deu a chance de dar um maior destaque para “fan favorite” da maioria e mostrar o quão cavalheiro ele é, sem contar que esse plot é o “triângulo amoroso” da segunda parte, junto a Penelope. Chega a ser engraçado ver tamanha mudança dos livros para a série aqui, a Marina só aparece no quinto livro e o seu final na série é como ela já é apresentada para nós e logo depois ela pratica suicídio e seu ex marido e viúvo passa a se envolver com a Eloise, a personagem protagonista do livro.
Os Featherington possuem muito mais destaque nessa obra visual e apesar dos temas mais pesados que os envolvem, eles meio que servem como alívio cômico devido ao excelente trabalho expressivo da Polly Walker (Lady Portia Featherington), a família é a azarada e constante uso de cores fortes contra os tons pasteis utilizado pela série enfatizam bem isso. O final deixou uma ponta enorme aberta e acho que elas terão ainda mais destaque e será muito interessante ver uma mulher naquela idade e suas filhas tendo que se reinventar completamente.
Logo que o trailer saiu, a série já começou a ser comparada com gossip girl, afinal de contas eram pessoas da alta sociedade tendo seus segredos expostos por uma fonte anônima, mas a série inova ao revelar o maior segredo logo na primeira temporada e a Lady Whistledown é a maravilhosa Penelope Featherington. Não sei se gostei ainda de ter sido revelado tão cedo, até porque tal segredo tem uma importância enorme mais a frente, vou esperar a próxima temporada para ver como vão trabalhar tal revelação. Nos livros, a Penelope e o Colin são endgame e tem sua história contada no quarto livro, porém o Colin faz essa viagem pelo mundo no quarto livro, então talvez eles possam adiantar a história dos dois para o segundo ano e com os indícios que a série deu sobre o Benedict, eu acho que na próxima temporada, a história dos três irmãos mais velhos será contada ao mesmo tempo.
A história dos três filhos mais velhos são Anthony se apaixona pela irmã de sua prometida, Benedict vive um conto tipo cinderela com uma empregada e o Colin é com a Penelope. Eu não acho que eles vão enrolar mais 3 anos para fazer o casal mais aguardado pelos fãs acontecer e como houve pequenos indícios de que o Benedict possa ser gay, eu acredito que eles usarão a história da cinderela com a Penelope e a única coisa que eu torço é que eles não façam ela emagrecer para ser notada pelo Colin. Quanto mais eu penso sobre a decisão de por os três homens juntos como protagonistas na próxima temporada, mais eu acho acertada, pois as interações mais engraçadas são quando o trio abc se reúnem e se seguirem essa linha narrativa, teremos muitas interações deles juntos.
Metade da tamanha qualidade da série não ocorreria se não fosse o excelente trabalho de toda equipe de produção, chega a ser invejável ver o tamanho cuidado para que tudo realmente se parecesse de época, foram feitos mais de 6000 roupas do 0, todo o jogo de iluminação, fotografia, direção e arte são excelentes. A série ainda conta com dois trunfos que ninguém imaginava, a narração é feita pela icônica Julie Andrews, também conhecida como a noviça rebelde e o outro é uma sacada genial que é de por musicais atuais em versões de época, como bad guy e wildest dreams, essa trilha sonora traz um frescor e diferencial para série sem tamanho, foi muito bom.
Bridgerton encerra o seu primeiro ano de maneira excelente, eu sou um grande fã dos livros e fiquei muito feliz que eles conseguiram criar uma história ainda melhor e a possibilidade de trocar de protagonistas ao longo das temporadas tem tudo para dar certo e não ser uma história repetitiva, nós vemos no próximo ano.